Analista do WWF-Brasil fala sobre potencial da energia limpa no Acre
Energia limpa na Amazônia e todo o potencial na região amazônica. Esse é um dos desafios das cidades: levar energia para os locais de difícil acesso para que todos tenham acesso à energia de qualidade e a um custo justo.
Em entrevista ao Jornal do Acre 1ª edição, a analista da WWF Brasil Alessandra Mathys avaliou o potencial que a Amazônia tem para gerar energia renovável e explicou como esse tipo de energia pode ser tão importante para melhorar a vida de quem mora em regiões de difícil acesso, como muitas comunidades isoladas da Amazônia. Mas, para ela, é preciso políticas públicas e investimento.
A plataforma Amazônia Que Eu Quero vai realizar, na primeira semana de fevereiro, o segundo fórum da plataforma com a temática Energias Limpas. O evento vai ocorrer no dia 8 de fevereiro, a partir da 19h30 (horário local), com transmissão simultânea no Youtube e também no canal de TV Amazon Sat. Esse é o segundo evento de uma série de cinco fóruns previstos em 2022 da Plataforma Caminhos da Democracia.
A analista diz que outra dificuldade na Amazônia são os problemas com logística.
“É preciso aproveitar o potencial renovável local e apostar na geração que é distribuída na Amazônia. O que é a geração distribuída? É gerar eletricidade perto do ponto de consumo, então, no caso da solar, pode ser nas telhas das casas, de postos de saúde, prefeituras, escolas, comércio, enfim”, explicou.
‘Energia da mandioca, couro de peixe e ouriço de castanha’
Mas, ela afirma que realmente a logística pode acabar sendo uma problemática para que essa energia chegue até essas comunidades. Ela diz que tudo pode partir de investimentos.
“É o complicador de não gerar energia, por exemplo, da mandioca que toda a Amazônia produz, que pode gerar etanol tanto para carro quanto para a eletricidade, gerar biogás dos restos de alimentos ou do couro de peixe ou em uma térmica. A gente pode queimar uns ouriços de castanha ao invés de diesel, então, essas são soluções que fecham localmente o ciclo da economia local e que não geram resíduos e poderiam demandar mão de obra local e incentivar ainda mais localmente as fontes. Então, é preciso acreditar e depois investir”, acrescenta.
A especialista afirma que já existem alguns projetos pilotos sobre energias renováveis na Amazônia que estudam a viabilidade de o projeto seguir em frente. “Agora é preciso dar os passos necessários, se não a Amazônia vai ser eternamente dependente do petróleo e a necessidade de transporte.”
Especialista da WWF fala sobre alternativas para a chegada da energia limpa nas comunidade isoladas da Amazônia — Foto: Divulgação/Petrobras
O Acre e a energia limpa
Sobre o Acre, Alessandra explica como é que seria possível chegar às comunidades mais afastadas.
“O Acre hoje tem uma potência instalada de quase 169 megawatts e 99% disso é de térmica, dessas térmicas 137 megawatts são fósseis, ou seja, mais de 25 empreendimentos a diesel. O óleo combustível só tem dois empreendimentos de biomassa, pouco mais de 30 megawatts e solar menos ainda, então, usina de 770 quilowatts e aí vários pequenos sistemas nas cidades, alguns de campo, que somam, no máximo, 15 megawatts. Isso deixa o estado do Acre na antepenúltima colocação na geração solar distribuída no país, há muitos desafios, mas o potencial da Amazônia é muito grande.”
Ela fala que a energia renovável e sustentável é a saída para que se possa chegar com energia elétrica até as comunidades isoladas. A forma de chegar com uma rede de distribuição tradicional como na cidade já aconteceu, segundo ela, e que não tem como cruzar rios e florestas para levar uma energia por fio, existem limitações.
“Do ponto de vista socioambiental e econômico, a energia renovável e de geração distribuída hoje as comunidades isoladas são reféns do combustível para manter mais ou menos três horas noturnas na cidade ou meia hora para uma bomba de água. Em alguns lugares o litro do combustível passa de R$ 10 nos postos fluviais que tem nas comunidades dentro dos rios,” explica.
A especialista da WWF Brasil diz que a Amazônia tem várias fontes de energia renovável que podem ser aproveitadas, seja a solar, a biomassa, como a caroço de açaí, por exemplo.
“A energia solar cresceu muito no mundo, mas, na Amazônia, ela carece de cadeias produtivas. Hoje há programas para levar eletricidade aos isolados e remotos como programas do governo federal, seja pelo Luz Para Todos, seja pelo Luz para a Amazônia, mas eles não dão conta de forma ágil para a necessidade das populações. A energia é um direito de todos e uma obrigação do estado e é uma pena que em pleno século 21 as comunidades isoladas da Amazônia ainda usem a energia dos séculos passados, tipo a lenha, querosene, diesel, é muito atraso e não precisa ser assim,” avalia.
Instalação de placas solares seriam alternativas para a chegada da energia limpa ns comunidades, diz especialista da WWF — Foto: Pixabay
Investimento
Alessandra fala que para que todo tipo de projeto piloto em comunidades seja colocado em prática é necessário investimento, políticas locais regionais, apoio das prefeituras e governos.
“Hoje a energia solar renovável, por exemplo, ela já é mais acessível economicamente. Se você comparar o preço que se paga por algumas horas por dia da energia com gasolina e ter o seu próprio sistema solar ele se paga em menos de três anos. Não se paga tão rápido, mas sabendo que são sistemas que duram mais de 10 anos e os painéis, as placas duram muito mais, eles geram energia por 25 anos.”
Outro problema para que esse tipo de energia limpa possa chegar até as comunidades é a manutenção.
“Mas, para isso funcionar, não basta instalar um monte de placas solares pela Amazônia e nas comunidades remotas se isso não vir acompanhado por um programa. Tem que ter troca de baterias, capacitação local para ter em cada cidade técnicos habilitados para manutenção, além de ter a oferta de equipamentos também próxima. Se isso não for organizado, o barato sai caro”, acrescenta.
Para ela, a energia renovável na Amazônia só vai ser possível se essa rede funcionar. “Só vale a pena se esse tripé funcionar, a capacidade técnica e o financiamento precisam andar juntos, é claro, isso tudo ancorado em políticas públicas não só do governo federal, mas dos governos estaduais e municipais.”
Educação, emprego e saúde
Além de todo o conforto que as comunidades terão se a energia limpa chegar até as comunidades, Alessandra ressalta que tem o mais importante que é o acesso à informação, educação, saúde e geração de emprego e renda.
“Tem uma questão de saúde, quando a pessoa tem a eletricidade 24 horas em casa ela tem acesso a uma água de melhor qualidade, tem refrigeração e, com essa refrigeração, elas podem tanto guardar como estocar alimentos. Isso facilita o trabalho dos monitores de saúde dos locais mais isolados, você pode ter telemedicina, por exemplo, que hoje as cidades com a pandemia fizeram tanto uso, mas foi um dificultador nas comunidades remotas.”
Com a energia nas comunidades seria mais fácil as pessoas terem acesso ao estudo sem precisar se deslocar para outras cidades, ela diz.
“Sobre a educação, tem lugares que têm energia 24 horas e que foram abertas turmas de jovens e adultos em comunidades isoladas, são pessoas que não querem mais sair das suas comunidades, porque agora elas podem trabalhar e estudar à noite, porque agora elas têm acesso não só à eletricidade no local da sua aula como também podem acessar televisão, vídeo e materiais didáticos fornecidos por governos e secretarias de educação,” finaliza.
fonte: g1acre